Um passeio pelas tradições portuguesas, em Dia de Todos os Santos

(Publicado a 31-10-2021)

Bolinhos e Pão por Deus, mesa posta para os defuntos, castanhadas, fogueiras nas ruas e bicas para as madrinhas, versos em forma de agradecimento, outros em forma de praga. Amanhã é Dia de Todos os Santos e ainda que o Halloween ameace a sobrevivência de alguns costumes bem portugueses, há muitas tradições, de Norte a Sul do país, que vale a pena conhecer.

Pão por Deus
Esta é talvez a mais conhecida das tradições portuguesas associadas ao Dia de Todos os Santos. Em várias regiões do país, as crianças saem à rua, em pequenos grupos e de porta em porta vão pedindo o “Pão por Deus”. Recitam alguns versos e em troca recebem pão, bolos e agora também guloseimas, quando antes eram broas, romãs e frutos secos, ou dinheiro.

Bolinhos e Bolinhós de Coimbra
Na zona de Coimbra, em vez de “Pão por Deus”, na véspera de 1 de novembro, as crianças pediam “Bolinhos, Bolinhós” (ou Bolinhinhos e Bolinhós), dizendo: Bolinhos, bolinhós, para mim e para vós, para dar aos finados, que estão mortos e enterrados. Antigamente o peditório fazia-se com uma caixa de cartão ou uma abóbora vazia, com dois buracos no lugar dos olhos e uma vela dentro.

O Pau das Almas em Bragança
No distrito de Bragança, celebra-se neste dia “O Pau das Almas”. Um grupo de rapazes vai buscar lenha num carro que não deve ser puxado por animais, vendem-na depois em hasta pública e o dinheiro angariado é destinado a missas rezadas pelas almas no Purgatório. Ainda nessa noite, a vizinhança oferece castanhas e outros frutos, pão e vinho e organizam-se festas.

Magustos e Castanhadas
Embora as castanhas sejam mais associadas ao S. Martinho, os chamados “magustos dos Santos” são populares nesta quadra e prolongam-se pelo mês fora, por todo o país. A sul, no Alentejo, os magustos ganham o nome de “castanhada” e reúnem amigos e familiares, no campo ou em casa, à volta da castanha e de um copo de Jeropiga.

Mesa posta para os defuntos
Em Barqueiros, distrito de Barcelos, à meia-noite do dia 1 para 2 de novembro, arranjava-se uma mesa com castanhas para os parentes já falecidos comerem durante a noite. Dizia-se que não se podia depois tocar nessa comida, porque ficava “babada dos mortos”.

Abóboras esculpidas
As abóboras esculpidas não são só uma tradição do Halloween, também se viam por cá. Na aldeia de Vila Nova de Monsarros, as crianças faziam os “santórios”, recebiam fruta e bolos e cada criança transportava uma abóbora oca com dois buracos a fazer de olhos e uma vela dentro.

Visitas aos cemitérios
Talvez a mais comum das tradições deste dia seja mesmo a visita aos cemitérios, para lembrar e prestar homenagem aos que já desapareceram. Neste dia, limpam-se e enfeitam-se as campas com flores e velas.

Bolos caveiras da Ilha Terceira
Na ilha Terceira, nos Açores, dão-se as “caspiadas” às crianças durante o peditório. São bolos com o formato do topo de uma caveira: uma forma de prestar culto aos mortos. Era também comum, nos Açores, no dia de “Pão-por-Deus”, ter em casa uma panela de milho cozido e castanhas cozidas para partilhar. Mais tarde surgiram os rebuçados e guloseimas, feitos com calda de açúcar e vinagre.

Fogueiras dos Santos
As “Fogueiras dos Santos” ateavam-se no centro das vilas e aldeias e eram comuns neste dia. Lugares de convívio, onde se comiam as castanhas, onde se cantava e jogava, mas sem dançar porque em dia de Santos não era permitido.

Bicas das madrinhas
Quer na Beira Alta, quer na Beira Litoral, os padrinhos e madrinhas oferecem aos afilhados, na manhã de dia 1, as chamadas “bicas”. Um pão de azeite, não fermentado, espalmado e retangular pincelado a azeite. Também na Beira Litoral é tradição trocar com os vizinhos, amigos e familiares os chamados «Bolinhos dos Santos» ou, de forma mais moderna, «broinhas». As diferentes receitas incluem frutos secos, sultanas e a tradicional erva doce, quase sempre presente.

Versos e cantos
Os peditórios são tradicionalmente acompanhados por cantares e versos, uns para pedir, outros para agradecer e outros ainda para insultar quem nada oferece. Os dois exemplos abaixo são atribuídos ao distrito de Coimbra:

Bolinhos e bolinhós
Para mim e para vós,
Para dar aos finados
Que estão mortos e enterrados
À bela, bela cruz
Truz, Truz!

Esta casa cheira a broa,
Aqui mora gente boa.
Esta casa cheira a vinho,
Aqui mora um santinho.

Aqui cheira a alho
Aqui anda algum dialho
Aqui cheira a louro
Aqui anda algum besouro
Aqui cheira a unto
Aqui anda algum defunto

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